Os artistas multidisciplinares Ricardo Jacinto e Arkadi Zaides encontram-se, pela primeira vez, para um programa que desafia a percepção da realidade através da manipulação de imagens e sons.
A partir da uma imagem da ilha de Lesbos, manipulada digitalmente por Arkadi Zaides, e transformada sonora e sensorialmente por Ricardo Jacinto, MEDO DO FUTURO é uma dupla instalação visual e sonora que questiona os limites da apropriação artística face ao potencial de controlo e de vigilância que as tecnologias oferecem.
As propostas convivem, por iniciativa curatorial dos alunos do 2º ano da licenciatura em Programação e Produção Cultural, num exercício de especulação sobre os limites da verdade, da informação e da responsabilidade de quem observa e participa, num convite à apropriação individual, à observação ativa e à criação de mecanismos de reação que ensaiem formas de anulação das distâncias física e emocional.
Numa afirmação artisticamente comprometida com a realidade trágica e quotidiana dos refugiados no Mediterrâneo, a experiência de observação é sublinhada pelo sentimento de falência política e ética que transforma a presença do visitante num espectador cúmplice.
É importante fazer notar que a abordagem a que os dois artistas se sujeitam não pressupõe uma interpretação apolítica do contexto social a que as obras fazem alusão. Precisamente por admitirem que, tal como eles, também os visitantes acedem à imagem e informação mediatizada, o trabalho de identificação das memórias, das marcas e das histórias que possam guardar-se – e esconder-se – no silêncio da imagem e na fantasmagoria do som, são armadilhas estéticas.
Nada nesta obras faz alusão direta a casos específicos, antes criando uma atmosfera perceptiva e intuitiva, onde, pela acumulação de informação, pelo cruzamento de várias fontes de informação – documental, jornalística, estética, artística – se instaura uma relação de proximidade e reconhecimento.
Iludidos pela cor – quente, apaziguadora, quase onírica – e pelo som – espectral, atmosférico, sensitivo, acedemos a um universo de referências especulativas a partir de memórias e de sensibilidades humanistas. Mais do que uma obra de denúncia, é um diálogo de frases que desaparecem, mais do que serem fixadas, construindo uma relação temporal e física alerta o suficiente para nunca se confundir – ou querer interpretar taxativamente – o drama mediterrânico.
— Tiago Bartolomeu Costa