Haverá sempre algo de absolutamente espectral numa relação epistolar. Uma presença ausente e um desejo de presença que sabemos não ser cumprido senão na evocação e na projeção de um diálogo que desafia o tempo.
A obra conjunta de Hugo Canoilas e da dupla Joana & Mariana, recupera uma ideia quase anacrónica para estes tempos forçosamente digitais, ao lançar o desafio de nos relacionarmos com esse tempo através da fixação da palavra, da intuição visual e da pretensa comunicação.
A hipótese de o fazer através de um movimento que carece de tempo, por ser contra-corrente, pede que o observemos enquanto exercício de resistência a um novo-normal que se instala de modo sub-reptício até fazer esquecer as razões dessa mudança.
O processo de transformação do diálogo entre obra e artista, entre discurso e recepção, entre memória e inscrição, ganha, aqui, a possibilidade de reagir aos tempos pandémicos, resgatando formas de diálogo, e de relação temporal, que assumíamos desacreditadas.
Entre a explosão de cor e as palavras de ordem, este objeto, ao mesmo tempo virtual e real, potencia a criação de relações simbólicas entre forma e significado, num exercício de imaginação e reação a todos os níveis de uma feliz anacronia.
A que exercícios de imaginação nos podemos entregar? A que hipótese de organização comunitária podemos reagir? De que modo podemos construir uma relação de proximidade na distância? O que é real na construção de um coletivo com tantos e tão variados pontos de partida?
Estas perguntas, formulações utópicas de interpretação desta obra coletiva, atendem não apenas ao processo de diálogo entre alunos e artistas, mas também entre os próprios artistas e destes com aqueles a quem o cartaz foi enviado, ou o possa encomendar.
São, ainda possibilidades de diálogo para um exercício de transformação do gesto artístico em gesto público, antes de ser político. Um gesto que se quer anunciador, mais do que executivo, por pretender lançar um diálogo e não determinar uma resposta direta ou única.
Podemos, contudo, admitir o seguinte: a ausência de resposta não é – ou não será – uma resposta menos relevante, ou menos certeira, do que a mais completa, e pretensamente cumprida, resposta que alguém possa dar. Precisamente, é porque este projeto desafia a própria lógica de diálogo imediato, porque impedida da presença física, que a resposta pode existir de diferentes formas, uma delas sendo o silêncio e, ou, a ausência.
Talvez o tempo que aqui esteja a ser proposto, não possa, ou não devesse, admitir respostas, e formas de resposta, anteriores a este tempo, precisamente para evitar cair na armadilha do novo normal. Talvez, a possibilidade de resposta careça de uma coexistência com a própria obra, tal como os artistas precisaram de aprender a recusar a proposta inicial de diálogo, construir, inventando formas, a sua própria hipótese de fala, e, agora que a mensagem foi enviada, esperar, o tempo que for necessário, por uma resposta que poderá nem vir, e que, de qualquer forma, nunca ficará completa por todas as que chegarem entretanto.